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Mineira multicampeã de jiu-jitsu se divide entre luta e carreira policial

'Policial, lutadora e forte', Karla Araújo brinca com fama em cidade pequena. Além da dupla função, atleta também dá aula para crianças em academia

16 de outubro de 2013


Artes marciais e carreira policial. Essa poderia ser uma associação comum na cabeça de muitas pessoas. Porque não policiais preparados com essas técnicas? O que aconteceria, caso fossem? Na cidade de Dores do Indaiá, no Centro-Oeste de Minas Gerais, os habitantes parecem estar se habituando a essa situação. Há cinco anos, chegava ao município Karla Araújo, policial, educadora física e faixa preta de jiu-jitsu. Hoje, abraçada pela população local, a escrivã da Polícia Civil conta que a luta a ajudou a ser bem recebida.

- Mesmo eu não sendo daqui, recebi o carinho do pessoal, até mesmo como cidadã de Dores do Indaiá. E eu acho que o fato de ser policial e lutadora ajudou muito nisso – disse Karla Araújo, de 33 anos, formada em Educação Física pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

A cidade parece estar acostumada a grandes lutadores de jiu-jitsu. Com menos de 20 mil habitantes, o local é berço de Rousimar Toquinho, ex-UFC, que ficou famoso no mundo do MMA pelas chaves de calcanhar e de joelho.

Já Karla prefere se dedicar inteiramente ao jiu-jitsu. Há mais de 10 anos no esporte, quando perguntada sobre os títulos que já ganhou em campeonatos da arte marcial, ela pareceu perdida em meio a tantas conquistas. Segundo a lutadora, ela é hexacampeã mineira, pentacampeã brasileira, campeã sul americana e pan-americana e tricampeã mundial. Todos os títulos na categoria acima de 74kg.

Em 2013, Karla Araújo participou do São Paulo Open Internacional de Jiu-Jitsu, nos dias 24 e 25 de agosto. Na ocasião, levou ouro em sua faixa e também na categoria Absoluto.

Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM, ela falou como concilia essas carreiras e de que forma isso já a ajudou em alguns momentos.

Que fôlego!

A vida da policial lutadora é complicada. Na tentativa de unir a carreira de policial aos campeonatos e treinos de jiu-jitsu, Karla contou que ao chegar em casa, só quer saber de dormir.

- É bem difícil para conciliar. Eu gosto de fazer as duas coisas bem feitas. Em 90% do meu tempo, eu tenho que ser policial. No restante, sou professora e lutadora. Saio da delegacia e já vou direto para academia, onde dou aulas para crianças de seis a 12 anos e adultos. Faço isso duas vezes por semana, e de 15 em 15 dias também ministro aulas nos finais de semana – explicou.

Karla dá aulas de jiu-jitsu há quatro anos na cidade. Começou o projeto pouco depois de chegar a Dores do Indaiá, pois não tinha como treinar ali.

- Comecei a dar aula para poder treinar. Porque aqui na região não tinha jiu-jitsu. Então, formei uma turma e comecei a pegar os mais experientes para treinar com eles. E é com isso que venho treinando, porque não posso ir sempre para Belo Horizonte para treinar – afirmou Karla, que é integrante da Equipe Gavião, da capital mineira.

Jiu-jitsu na carreira policial

Apesar de atuar como escrivã na Polícia Civil, Karla Araújo também dá uma mãozinha em algumas ocorrências na rua. Em um contingente não muito grande de policiais, em uma cidade do interior, ela e a delegada da cidade são as únicas mulheres da corporação.

- No interior, a gente costuma brincar que é uma clínica geral, porque você faz de tudo um pouco. Eu deveria trabalhar só dentro da delegacia, como escrivã. Mas como eu e a delegada somos as únicas mulheres da corporação, em todas as ocorrências que envolvem mulheres eu tenho que estar lá para preservar o direito delas. Quando ocorrem grandes operações, também vou ajudar a abordar pessoas e a entrar em casas para cumprimento de mandados. Às vezes também chutamos a porta – brincou.

A lutadora parece saber utilizar o fato de ser lutadora durante sua prática policial. De acordo com Karla, a arte marcial já a ajudou em alguns episódios na carreira.

- Teve uma prisão que auxiliei, que estavam duas mulheres. Precisei contê-las, segurá-las, para que fosse feita uma revista minuciosa na casa. Segurei usando um golpe de jiu-jitsu, para não doer. Mas caso elas mexessem, aí ia machucar – contou.

E o fato deu o que falar entre os detentos.

- Isso deu uma repercussão entre os presos... A mulher da ocorrência falou para os outros detentos que eu era muito forte e que ninguém deveria brigar comigo. Comparada a outras mulheres, eu sou muito forte. Então todo mundo fica meio receoso. Pensa: policial, lutadora e forte – disse bem-humorada.

Preconceito e escolha

Mostrando bom humor ao contar "causos" da carreira, Karla, quando perguntada sobre desafios e preconceitos a serem vencidos no ambiente policial, indica que, mesmo com apenas duas mulheres na delegacia, não existe resistência.

- Até que não sinto nenhum tipo de preconceito, é muito tranquilo. O pessoal aqui me respeita muito. Muita gente me coloca como um modelo, já percebi isso. Acho muito interessante. Eles me dividem: tem gente que quer ter a perna da Karla, tem gente que quer malhar igual, querem bater igual. Então, por eu ter uma vida tranquila, sendo respeitosa, consegui muito respeito na cidade – ressaltou.

Desafiada a fazer uma escolha entre as carreiras, Karla fica em cima do muro. Seguir no jiu-jitsu ou na carreira policial?

- Eu ficaria numa “sinuca de bico”, bem dividida. Para ser prática, o jiu-jitsu é minha paixão, meu amor. Mas infelizmente não dá uma boa renda aqui no Brasil. A polícia também é algo que eu amo, até porque boa parte da minha família é formada por policiais. E é onde eu consigo meu ganha pão. Então, enquanto eu conseguir unir as duas, eu vou – finalizou.

Fonte: Globoesporte.com